Caderno 2

Por, Bairros de Maceió - 01/05/2018

Cool Jazz Caeté - Renata Peixoto

O Infinita apresenta Renata Peixoto e a define pela exatidão e delicadeza, que estarão sempre implícitas à escolha do seu repertório

Publicado dia 22/03/2018 pelo Caderno B, do jornal Gazeta Alagoas, por Por: Mácleim

COOL JAZZ CAETÉ

          Em agosto de 2016, Renata Peixoto fez o lançamento oficial do Infinita, no palco do Teatro Deodoro. Desde então, fiquei na expectativa do disco físico, que só agora chegou para vendas, divulgação e afins. Mantive o meu interesse em suspense e não o procurei nas plataformas digitais, pois sabia que só assim aconteceria a magia que eu mesmo guardara para mim, quando estivesse com o álbum nas mãos. Tipo abrir uma caixa, daquelas que a gente esquece guardada por tanto tempo em um canto qualquer, que nem lembra mais dos objetos que lhe dão conteúdo. Daí, tudo é uma grata surpresa. Esse foi o meu sentimento à primeira audição do Infinitas: um achado do que eu não conhecia, mas, que tinha uma saudade improvável pela descoberta.      

          A partir daí, as surpresas se alternaram de maneira positiva e com as ressalvas que lhe são peculiares. Antes de ir direto ao ponto, acho que cabe aqui, como referência, o que li em uma recente entrevista do Zé Renato, pois comungo inteiramente com o seu ponto de vista. Disse ele: “Não desfazendo de nada do que ouvimos hoje, o que me conecta à música são justamente as melodias e as harmonias, mais do que as letras. A riqueza de caminhos é o que me comove. Hoje temos um distanciamento disso. O público se distanciou.”

          Infinita, o álbum, tem a possibilidade de reconexão com o que falou o Zé Renato, encurtando o distanciamento, sobretudo, para o fruidor, que ainda não se deixou levar pela intencionalidade do que é hegemônico e acrítico, do que se contextualiza na filosofia basilar, que orienta a demanda do mainstream. “A riqueza de caminhos”, que encontramos no Infinita, possibilita a percepção de onde realmente melhor se situa Renata Peixoto, como intérprete e como adequação ao seu talento.

          Infinita (Gab e Renata Peixoto) é um blues que abre o disco, lhe confere o título e dá a dica que, de cara, teremos um belo perfil de quem é e em qual região de conforto atua a jovem e talentosa Renata Peixoto. Na letra de Infinita, ela diz que já foi várias mulheres finitas e infinitas, que já usou a duplicidade e, por fim, “posso ser o que você quiser”! Musicalmente, ela demonstra toda essa versatilidade que, como um paradoxo, aponta para o cerne central de sua sensibilidade e desempenho como intérprete: o cool jazz! Ele, que saiu lá de Nova York, nos anos 40, e veio encontrá-la aqui no aquário. Ela, cronologicamente bem mais jovem, mas habilidosa o bastante, para sugerir comparações e afinidades com as divas desse gênero. Muito embora, Renata Peixoto tenha algo de Elis, que não é exatamente pelo viés musical, mas, talvez, pela aura, pelo conjunto do que espiritualmente me é sugerido por ela.     

        Renata tem um timbre vocal delicado, com nuances até pueris, que ressaltam ainda mais sua perfeita opção pelo cool jazz e por temas nos quais os arranjos sejam clássicos e econômicos o bastante, para que assim possibilitem a colocação da sua doce e sutil voz, com a precisão e realce que o gênero propicia às suas grandes intérpretes. É assim que o Infinita apresenta Renata Peixoto e a define pela exatidão e delicadeza, que estarão sempre implícitas à escolha do seu repertório.

           Isso fica evidente, quando ela, na faixa 6, Azuis (Renata Peixoto) – não por acaso uma composição só dela, que facilmente poderia se tornar um clássico do cool jazz – demonstra toda a influência que o gênero tem sobre si, como intérprete e compositora. Logo na faixa seguinte, o funk Leve e Claro (Gab e Renata Peixoto) tem o peso dos arranjos de metais e o swing característico. Daí, ser inevitável a comparação entre as atuações da intérprete. Antes, serena e magneticamente sedutora em sua atmosfera natural. Em seguida, parece um tanto fora de contexto, de tão bom e refinado o que era antes. Portanto, percebe-se claramente onde habita o cerne musical de Renata Peixoto.

          Não me apraz pontuar falhas técnicas, mas não estou aqui para escrever releases e sim, tentar analisar os trabalhos que me chegam e que, por si só, são passíveis de erros e acertos, assim como eu e tudo mais na aventura humana. Não se trata de nada com gravidade suficiente para comprometer este belo trabalho, mas não dá para passar incólume a saturação de um instrumento, ou da voz, por descuido técnico na mixagem ou captação. É o caso da faixa 6, Azuis, justamente um dos melhores momentos do disco, onde as notas do solo do baixo acústico, na introdução, estão saturadas. Provavelmente, o ouvinte descompromissado com a lupa sequer perceba, portanto, não compromete. Porém, seria leviano, pelo ponto de vista construtivo, não chamar atenção para esse tipo de deslize, pela simples possibilidade de que coisas assim, tão primárias, não mais se repitam.   

         O fato é que Renata Peixoto obteve uma estreia fonográfica prá lá de exitosa.  Realmente infinita de possibilidades virtuosas, que apontam para um futuro brilhante e promissor. É um trabalho delicioso de se ouvir e ouvir e ouvir novamente, que até por isso guarda o simbolismo da leminiscata, em sua figura geométrica de infinitude.

SERVIÇO
Infinita, Renata Peixoto
Disco físico: à venda pelo fone (82)99672-8594
Preço: R$ 10
Plataformas digitais: Spotify, Deezer, Google Play e iTunes

Ouça o álbum aqui na WebRadio Maceió

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Curiosidade

Treze vezes vencedor do prêmio Notáveis da Cultura Alagoana - Prêmio ESPIA.

"Uma cidade que não tem memória é uma cidade sem alma. E a alma das cidades é sua própria razão de ser. É sua poesia, é seu encanto, é seu acervo. Quem nasce, quem mora, quem adota uma cidade para viver, precisa de história, das referências, dos recantos da cidade, para manter sua própria identidade, para afirmar sua individualidade, para fixar sua municipalidade." Extraído do livro Maceió 180 anos de história 5 de dezembro de 1995.

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