Pesquisa: José Ademir Texto: Jornalista Jair Barbosa Pimentel
“Nas noites de serestas, a Pitanguinha vai à lua”
Bairro típico, que mais parece uma cidade tranqüila de interior, com um povo hospitaleiro, festeiro e organizado. Tudo limpo, arborizado, a pracinha, a Igreja, gente simples nas calçadas, e nas noites de lua cheia, a serenata atravessando a madrugada, embalando os sonhadores, com músicas românticas. No carnaval o povo vibra com o “Pitanguinha Vai à Lua”, bloco organizado pelos moradores que marcou os velhos carnavais de Maceió.Assim é Pitanguinha, um bairro que abriga gente pobre e rica, num ambiente de cordialidade e união. Um avançado projeto de reciclagem de lixo doméstico, é exemplo já citado na imprensa. A Igreja de Nossa Senhora das Graças e o abnegado do monsenhor João Leite propaga a fé católica de um povo bom, honesto e trabalhador, que cresce amando o próximo.
Desde que começou a povoar-se, o bairro da Pitanguinha sempre foi motivo de orgulho para seus primeiros moradores. A tranqüilidade do planalto, com o verde por todos os lados, as pitangueiras, os coqueirais e o riacho em sua parte baixa, proporcionava um aspecto de sitio, que durou por muitos anos, até o progresso chegar.
Mas é lá que vive ainda o tenente Antonio Gonçalves de Melo, que, do alto dos seus 90 anos de idade, esbanja saúde e força de vontade para trabalhar, mantendo até hoje a sua Fazenda Santo Antônio, criando gado, plantando lavouras de subsistência e usufruindo de uma vida rural em plena capital, bem próxima à avenida mais movimentada de Maceió: a Fernandes Lima.
O Pintanguinha Vai à Lua nunca mais desfilou no carnaval, por falta de verba. Mas a seresta, organizada pelos moradores festeiros do bairro, sempre é realizada uma vez por mês, aproveitando-se a lua cheia. São autênticos violonistas e tocadores de cavaquinho que percorrem as ruas, sempre acompanhados de improvisados cantores, entre velhos e jovens, que garantem manter esse ritual por muito tempo ainda, passando de pais para filhos.
A Casa é Sua – a Matriz Nossa Senhora das Graças
Monsenhor João Leite Neto faz parte da História da Pitanguinha, o bairro que escolheu para trabalhar como ministro do Senhor, o bom amigo de todos, um verdadeiro pastor. Conseguiu levantar a nova Igreja, mais ampla e bela, graças ao esforço da própria comunidade. A luta foi árdua, mas valeu a pena, como afirma o próprio sacerdote e pároco do bairro, que chegou a escrever um livro sobre os acontecimentos que resultaram na construção da nova matriz: A Casa é Sua, com depoimentos importantes, como o do então arcebispo metropolitano de Maceió, dom Miguel Fenelon Câmara.
Tudo começou em 1951, quando foi erguida a capela de Nossa Senhora das Graças. Passaram-se muitos anos para a conclusão das obras. A cada dia, era uma etapa vencida, graças ao apoio da própria comunidade. Houve apoio dos prefeitos Divaldo Suruagy, João Sampaio e Dilton Simões.
Bela e majestosa, a matriz da Pitanguinha tem sua fachada com uma cruz projetada pelo engenheiro José Arnaldo Lisboa Martins. Todo o trabalho, feito com muito amor e fé cristã, chegou ao seu final feliz, e hoje o templo sagrado do bairro é o ponto de encontro dos católicos, que recebem o carinho e a dedicação do monsenhor João Leite Neto, esse alagoano do Anel de Viçosa, que orgulha o clero alagoano.
Seresta e poesia são marcas do bairro
Há dois anos, um grupo de moradores do bairro da Pitanguinha pensou em animar as noites, em estilo romântico. Quem sabia tocar violão ou cavaquinho e cantar, podia se apresentar, que a partir dali, uma vez por mês, sairia uma seresta pelas ruas, varando a madrugada em noite de lua. A idéia foi amadurecendo, deu certo e até hoje os seresteiros e poetas são marcas registradas desse bairro que cresceu, modernizou-se, mas nunca deixou o romantismo de lado. Dona Alda Quintela, criadora do projeto Pitanguinha Minha Vida, é também seresteira. O grupo sai da porta do Posto e Saúde e vai juntando gente, até ninguém agüentar mais cantar e tocar violão. Já houve ocasião em que amanheceram o dia. Ari Lins Pedrosa, morador do bairro, é poeta dos bons. É de sua autoria a poesia “A Pitanguinha”, relatando a paisagem do bairro. Na outra ponta do gosto literário dos moradores da Pitanguinha, encontra-se Dona Edite Camelo, com suas marchinhas de carnaval, preparadas para o desfile do bloco carnavalesco do bairro habitado por um povo festeiro por natureza, que gosta de se divertir de noite de lua e da boa musica popular brasileira e da poesia.
Moradores dão exemplo de criatividade e organização
Quem visita a Pitanguinha não pode deixar de conhecer o projeto “Pitanguinha Minha Vida”, uma iniciativa de seus moradores que começou há cinco anos e vem atingindo seus objetivos, já contando com o apoio de todos os segmentos da sociedade alagoana. As ruas são limpas, com todo o lixo sendo reciclado e reaproveitado pelos próprios moradores que se engajaram no trabalho. Dona Alda Quintela Cavalcante é a maior entusiasta desse projeto. Ela conta que tudo começou em 1991, através de um projeto do IMA (Instituto do Meio Ambiente) e da empresa GTZ, da Alemanha. Foi o engenho Carlito Lima que levou o projeto para o bairro, sabendo que os seus moradores iriam acampá-lo. Deu certo, e houve o engajamento da Cobel, da Cinal, Salgema, Trikem, Petrobrás e da Importadora Auto Peças, além do Sebrae.
Segundo dona Alda Quintela, os moradores se adaptaram muito bem. No inicio, o projeto era somente para pegar o material reciclado e vende-lo. Depois, segundo ela, notou-se que podia-se separar tudo., e ai começa o trabalho de reciclagem e reaproveitamento. No Centro de Criatividade tudo é aproveitado e transformado em produtos para nova utilização. Outro entusiasta do projeto é José Duca dos Santos Filho, nascido no bairro e que se dedica de corpo e alma a essa causa, consciente de que é um trabalho só traz retorno satisfatório para toda a comunidade. Hoje, ele pode afirmar com convicção que Pitanguinha é o bairro mais limpo e organizado de Maceió.
Fundador relata como surgiu a Pitanguinha
Uma fazenda em meio ao burburinho da cidade grande, onde se cria gado, muitos coqueiros, horta e tudo que se tem direito na zona rural. Assim é a Fazenda Santo Antônio, do tenente Antonio Gonçalves de Mello, um pernambucano de bom conselho, que chegou a Maceió ainda menino, criou raízes e hoje, aos 90 anos, ainda esbanja saúde e é excelente arquivo da historia política e economia de Alagoas.
Conta o tenente Gonçalves que adquiriu a fazenda por 2 contos de réis, a Cavalcante Moura. Plantou 2 mil coqueiros foi expandindo as atividades rurais. Tinha muitas pitangueiras por toda a redondeza, e daí foram surgindo forasteiros, até que terminaram dando o nome de Pitanguinha, alusão a um pé de pitanga que se destacava porque era pequeno e dava bons frutos.
A área também pertencia à família Gerbase, uma das mais tradicionais de Maceió. Os irmãos Vicente e Antonio Gerbase possuíam uma imensa área, onde hoje está a rua Antonio Gerbase, uma das primeiras e mais arborizadas do bairro. Na época, o bairro foi surgindo com casas de palha e tinha como moradores, além do tenente Gonçalves, em sua fazenda: João Levino, José Pinheiro, João Garrafeiro e Candido Barbeiro. A água canalizada quem inaugurou foi Arnon de Mello, quando governador de Alagoas.
A ladeira da Moenda, hoje toda pavimentada, foi construída pelo tenente Gonçalves e outros moradores. Tudo era mato. Foi ele que plantou fruteiras, fez a estrada e ligou o Feitosa a Pitanguinha e Farol. Na administração do prefeito Abelardo Pontes Lima, construíram a ponte sobre o riacho Reginaldo. Hoje, o que a Pitanguinha é, um bairro organizado, limpo e tranqüilo, deve-se ao seu fundador, o tenente Gonçalves, o exemplo vivo de que com trabalho e união tudo se consegue.
Publicado em O JORNAL, Maceió, domingo, 10 de novembro de 1996.