Caderno 2

Por, Bairros de Maceió - 01/10/2013

Espetáculo Linguagem Emocional dia 03 terça feira no Teatro Deodoro

Linguagem emocional: sem grapette, com açúcar e com afeto

Diversidade de sons, ritmos e temas: do maracatu ao chorinho, da bossa ao xote. Nesse caleidoscópio musical, Benedito Pontes apresenta o resultado do amadurecimento de uma arte que veio com a maturidade e ocupou todos os espaços.



No próximo dia 03 (quinta-feira), a partir das 20h30, o DVD Linguagem Emocional – o mais recente registro do trabalho do compositor Benedito Pontes – será lançado no teatro Deodoro, com o espetáculo homônimo que tem direção musical de Antônio Carmo e direção cênica de Arnaud Borges.
O CD, também incluído no projeto Linguagem Emocional, estará à disposição do público no hall do teatro. É o quarto trabalho autoral desse artista versátil, com um pé na música e todo o resto engajado no debate de temas que lhe servem de inspiração. Em 2007, Benedito lançou “Mãe Terra”, vinculado ao projeto ecológico que dá nome ao registro fonográfico. Já no ano seguinte, realiza “Quem for podre que se quebre”, uma coletânea de frevos, marchas-rancho e sambas de sua própria lavra. Um desses frevos ganhou as ruas no carnaval, como um dos temas do bloco Pinto da Madrugada.
Nesse curso, Benedito Pontes nunca mais parou de compor e a prática tornou-se “uma espécie de compulsão”, como revela o artista. “Pássaro Negro”, um tributo a Zumbi dos Palmares, foi classificada na edição 2009 do FEMUSESC e em 2010 acontece mais um CD autoral: “O perigo é gostar”, dessa feita, um trabalho calcado no forró pé de serra. No final do mesmo ano, musicou seis poemas do poeta Bartolomeu Miranda (Alagoas) e das poetisas Helena Cristina Buarque (Curitiba), Valéria de Cássia (Campinas), Ana Paula Fumian (Espírito Santo) e Anja (Rio Grande do Sul).
Dessa forma, Linguagem Emocional – CD e DVD – nasce do amadurecimento musical e poético do compositor e, por conseguinte, revela, sem pruridos, muito mais sobre sua vocação e destino artístico; diz a que veio: “não pretendi, nesse trabalho, falar da linguagem corriqueira, definida em nosso espaço tridimensional, mas mergulhar em um “idioma” diferenciado, uma linguagem emocional que vá direto ao coração e convide a refletir sobre a existência, os sentimentos, as escolhas”, diz Benedito Pontes.

Em 2012, na gravação do DVD que está sendo lançado quase um ano depois – o artista dividiu o palco com intérpretes da estirpe de Claudinete Lima, Lima Neto, Neto MCZ, Myrna Araújo, Vânia Garcia e Madalena Oliveira que, segundo ele, “tiveram total liberdade para imprimir sua marca nas interpretações de cada uma das peças” e deram corpo e alma a canções como Nada Trivial, Movimento das águas, Meu Segredo, Amor todo seu, Vem Comigo e Só você, respectivamente, todas arranjadas pelo maestro Antônio Carmo.
Além dessas belas vozes, Linguagem Emocional traz à mira dos holofotes 20 de alguns dos mais talentosos músicos da cena alagoana: Orieta Feijó e Antônio Carmo (piano), Joselho Rocha (viola e violino), Vanessa (violino), Miran Abs (flauta e violoncelo), Diogo Amorim (contrabaixo), Tony Augusto (guitarra), Wilbert Fialho (violão), Felipe Pontes (cavaquinho), Everaldo Borges (flauta e sax), Coronel Cláudio (clarinete) Tarciso (trombone), Érico (trompete), Van Silva (baixo), Theo Gomes (bateria), Ronalso (percussão e efeitos especiais) e Xameguinho (sanfona).
Mas o elenco de atrações do espetáculo não termina aqui. Benedito Pontes exercitou o direito de celebrar esse momento convidando mais quatro emblemáticos nomes da música local: Júnior Almeida, Irina Costa, Mácleim Damasceno e Didha Lyra. O compositor se diz emocionado com o fato de os artistas terem aceito o convite: “eu já os admirava e acompanhava o trabalho de cada um. Dividir o palco com eles será a realização de um grande e velho sonho. Estou muito feliz por tê-los mais próximos, pessoal e artisticamente”.


“Foi na maturidade que percebi um potencial absolutamente novo, prova inconteste de que a mente, quando exercitada, continua funcionando e, em alguns casos, funciona até melhor.” (Benedito Pontes)


Benedito de Vasconcellos Pontes, muito antes de se tornar um compositor/intérprete, atuava em outras tribos, na verdade, bem longe das letras e artes: a engenharia civil, o Centro de Ciências Exatas e Naturais da UFAL, do qual foi diretor por quatro anos. Portanto, uma área conhecida pela exatidão de conceitos e estigmatizada como “fria e calculista”, aparentemente incompatível com a sensibilidade que caracteriza os militantes das diversas linguagens artísticas.
Mas, segundo Benedito Pontes, esse raciocínio “simplório e reducionista” não corresponde às reais virtudes das ciências exatas: “quem conhece melhor os signos da música – que eu ainda não domino, diga-se de passagem – sabe que eles são praticamente matemáticos. As notas têm valores exatos, os compassos obedecem a contagens, as partituras têm exatas cinco linhas, enfim, tudo na música é mensurável, menos a emoção que ela transmite”.
E é sobre essa emoção que o compositor vem se debruçando nos últimos sete anos quando, já aposentado do ofício de professor universitário – e vivendo no bucólico sítio Nina, em Paripueira – cujo nome homenageia a mãe – entre árvores frutíferas, um mar muito verde e animais de estimação – entendeu que um novo ciclo começava em sua vida: “isso contradiz os que entendem a maturidade apenas como momento de descansar, fazer crochê, jogar gamão e curtir uma boa cadeira de balanço. Nada contra essas atividades – são todas prazerosas –, mas foi na maturidade que percebi um potencial absolutamente novo, prova inconteste de que a mente, quando exercitada, continua funcionando e, em alguns casos, funciona até melhor”, revela. 
E Pontes levou esse exercício a sério: tornou-se membro do Clube Caiubi de compositores, obtendo destaque com várias músicas, e diversificou sua atuação, criando – em parceria com a esposa e também musicista e compositora, a pianista Orieta Feijó –, o grupo “Ero Dictus” que tem como princípio divulgar a música erudita no Estado.


“Retornar ao Deodoro, dessa vez sobre o palco, como protagonista, é uma dádiva. Ele sempre esteve no rol de nossas brincadeiras preferidas...” (Benedito Pontes)

A mudança radical em sua rotina retirou Benedito Pontes do discreto anonimato de professor aposentado e o conduziu, sem escalas, para o inquieto universo artístico alagoano. Assim, o artista tem participando de entrevistas em emissoras de rádio e TV, jornais e, mais recentemente, veiculado alguns trabalhos no Youtube.
Esse trânsito intenso levou o compositor a refletir sobre passagens distantes da vida, em imagens que a nova realidade evoca para, segundo ele, “referendar a sabedoria” de dona Nina: “como quase toda mãe, ela zelava por minha saúde, induzindo-me a comer frutas e verduras compradas ali pertinho de casa, na feira da Rua das Verduras, transversal da Rua da Floresta, onde morávamos, e passagem obrigatória pelos fundos e lateral do Teatro Deodoro. Eu repelia a ideia sem, sequer, experimentar. Falava para mim mesmo: ‘isso é coisa de mãe dominadora. Prefiro tomar Grapette (um refrigerante da moda)’, sob influência do locutor da rádio que insistia: ‘quem bebe Grapette repete’”.
As lembranças que mobilizam o compositor para esse momento de vida são bem arrazoadas. Não havia, ainda, televisão, menos ainda, internet. As crianças de então – entre elas, Benedito Pontes, que sempre morou no Centro de Maceió, tendo o prédio do Deodoro como permanente referência – brincavam, em meio a outras traquinagens, de abraçar e escalar árvores frondosas, feito o gigantesco tamarineiro plantado nas imediações e decepado, anos depois, para a tristeza dos meninos de antes.
No porão do teatro, onde hoje funciona uma espécie de oficina de marcenaria e depósito, morava a família Ciqueira, cujo chefe era empregado daquela casa de espetáculos. Juntavam-se Benedito Pontes e o amigo de infância, João, filho do Ciqueira-pai, e a reinação estava feita. Curiosos e buliçosos, os meninos assistiam – das coxias ou pelas frestas da escada sobre as varas de cenário e luz, dispostas acima do palco – a todos os espetáculos, incluindo os proibidos para sua idade, burlando a vigilância dos mais velhos. Em outros momentos, improvisando a cesta, jogavam basquete no terraço superior do teatro. “Retornar ao Deodoro, dessa vez sobre o palco, como protagonista, é uma dádiva. Ele sempre esteve no rol de nossas brincadeiras preferidas e hoje agrega valor ao  Linguagem Emocional. É uma grande emoção”.
O artista remete-se, mais uma vez, à feira e à dieta de frutas e verduras, proposta por dona Nina: “quanta estupidez de minha parte! Uma feira com um multicolorido natural e cheiros maravilhosos, tudo a ser explorado, desafiando meus sentidos e eu nem aí, só Grapette. Hoje percebo quantas oportunidades de me humanizar e desenvolver minha sensibilidade aquela feirinha me oferecia. E mais, como gostar ou deixar de gostar de algo que eu nem me permitia conhecer?”
Entre uma reflexão e outra, Benedito Ponte define sua vocação e a proposta primordial de Linguagem Emocional que está longe de ser, simplesmente, entreter ou apresentar resultados estéticos: “venho buscando entender melhor a juventude atual, bombardeada pela multiplicidade de ofertas de mercado que tentam anestesiá-la e convencê-la de que a felicidade se resume em consumir, consumir e consumir, sem limite, sem critério. Daí, me pergunto: quem estará consumido quem? Quero que minha música, além de ser um exercício de inspiração e transpiração, seja, também, um canal para que se discutam questões como esta. Quero chegar, também, ao coração dos jovens e aprender com eles”, conclui o artista.

Serviço:
Evento: espetáculo lítero-musical Linguagem Emocional
Onde: teatro Deodoro
Quando: 03 de outubro, às 20 horas
Ingressos: R$ 10,00 (meia entrada) / R$ 20,00 (inteira)
Mais informações: 9909-9434 / 9971-9654 / 9645-1118

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Curiosidade

Treze vezes vencedor do prêmio Notáveis da Cultura Alagoana - Prêmio ESPIA.

"Uma cidade que não tem memória é uma cidade sem alma. E a alma das cidades é sua própria razão de ser. É sua poesia, é seu encanto, é seu acervo. Quem nasce, quem mora, quem adota uma cidade para viver, precisa de história, das referências, dos recantos da cidade, para manter sua própria identidade, para afirmar sua individualidade, para fixar sua municipalidade." Extraído do livro Maceió 180 anos de história 5 de dezembro de 1995.

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